PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI (TURMA) Nº 0518362-84.2016.4.05.8300/PE
RELATORA: JUÍZA FEDERAL CARMEN ELIZANGELA DIAS MOREIRA DE RESENDE
REQUERENTE: ROSALVA DE SOUZA
ADVOGADO: MARIA JOSE DE SALES FERNANDES
REQUERIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DA PARTE AUTORA. AGENTE NOCIVO PREVISTO NA GRUPO 1 DA LINACH, PORÉM, NÃO CONTEMPLADO COM NÚMERO DE REGISTRO NO CAS (CHEMICAL ABSTRACTS SERVICE). ANÁLISE QUALITATIVA. POSSIBILIDADE. PEDILEF CONHECIDO E PROVIDO.
RELATÓRIO
Trata-se de Incidente de Uniformização Nacional, suscitado pela parte autora, em face de julgado oriundo da 3ª Turma Recursal do Pernambuco, que deu provimento ao Recurso Inominado do INSS, considerando comum a atividade desenvolvida com submissão ao agente radiação ionizante.
Afirma que, como espelham os autos, a Requerente, até janeiro de 2009, exerceu a atividade de técnica de raio X, realizando mamografia (100 por expediente) na sua empregadora CLÍNICA RADIOLÓGICA LUCILLO MARANHÃO.
Sustenta que comprovou a atividade especial de 1989 a 2009, mediante a apresentação do PPP que atesta a atividade de Técnico em Raio X e que estava exposta a raio ionizante. Aduz que o PPP dispensa o Laudo Técnico ou LTCAT, eis que o empregador ou representante legal preenche à luz do PPRA dentre outros laudos firmado por engenheiro e médico do trabalho que detém a empregadora em seu poder, para fins de fiscalização do Estado.
É o breve relatório.
VOTO
Nos termos do art. 14, § 2º, da Lei nº 10.259/01, o pedido de uniformização nacional de jurisprudência é cabível quando houver divergência entre decisões sobre questões de direito material proferidas por turmas recursais de diferentes regiões ou em contrariedade a súmula ou jurisprudência dominante da Turma Nacional de Uniformização ou do Superior Tribunal de Justiça.
Nota-se claramente que o que motivou a Turma de origem a considerar o tempo de atividade da autora com exposição a radiação ionizante como tempo comum foi o fato de que "embora esteja elencada na LINACH e no Anexo IV do Decreto nº 3.048/1999, a radiação ionizante – assim como a poluição do ar, a radiação solar, o tabaco, entre outros – não possui Chemical Abstracts Service - CAS, daí porque a análise qualitativa não se mostra suficiente à constatação das condições especiais de trabalho.
Eis o voto proferido pela Turma Recursal de origem, na parte que interessa ao deslinde da controvérsia ora em análise por este colegiado:
"No caso em tela, os formulários de PPP acostados aos autos sob os anexos 7/8 descrevem que a autora exerceu atividades como "técnica de raio x", com exposição à radiação ionizante.
Não obstante a TRU5 tenha perfilhado entendimento no sentido de que seria desnecessária a análise quantitativa quando se tratar de exposição do segurado à radiação ionizante, vez que tal agente estaria elencado na LINACH (Portaria Interministerial MTE/MS/MPS Nº 9, DE 07 DE OUTUBRO DE 2014), cumpre destacar que tal entendimento diverge do que vem sendo adotado pela TNU no enfrentamento do tema.
Com efeito, no julgamento do PEDILEF 05006671820154058312 (Rel. Juíza Federal GISELE CHAVES SAMPAIO ALCÂNTARA, DOU 16/03/2017), restou estabelecido que “serão considerados agentes reconhecidamente cancerígenos os constantes do Grupo 1 da lista da LINACH que possuam o Chemical Abstracts Service - CAS e que constem do Anexo IV do Decreto n. 3.048/99”.
Muito embora esteja elencada na LINACH e no Anexo IV do Decreto nº 3.048/1999, a radiação ionizante – assim como a poluição do ar, a radiação solar, o tabaco, entre outros – não possui Chemical Abstracts Service - CAS, daí porque a análise qualitativa não se mostra suficiente à constatação das condições especiais de trabalho.
Apesar de esta Terceira Turma já ter promovido readequação de julgamento em cumprimento à decisão proferida pela TRU no Processo 0503370-
21.2016.4.05.8300, em razão do efeito substitutivo desta relativamente à decisão proferida pela Turma Recursal, deve ser prestigiada, neste momento, a jurisprudência da TNU, não apenas por medida de economia e celeridade processual, mas também por uma questão de isonomia e segurança jurídica.
Desse modo, a exposição ocupacional a radiações ionizantes dará ensejo à caracterização de período especial quando:
I - até 5 de março de 1997, véspera da publicação do Decreto nº 2.172, de 5 de março de 1997, de forma qualitativa em conformidade com o código 1.0.0 do quadro anexo ao Decretos nº 53.831, de 25 de março de 1964 ou Código 1.0.0 do Anexo I do Decreto nº 83.080, de 1979, por presunção de exposição;
II - a partir de 6 de março de 1997, quando forem ultrapassados os limites de tolerância estabelecidos no Anexo 5 da NR-15 do MTE.
Nesse cenário, deve ser mantida a especialidade apenas do período laborado pela autora entre 01/02/1989 a 05/03/1997.
O período posterior a 05/03/1997, por outro lado, deverá ser computado como tempo comum, tendo em vista que não foi realizada a análise quantitativa do agente.
No paradigma apresentado, oriundo desta TNU (Pedilef 5003870132015404720) este colegiado adotou o critério qualitativo na aferição de especialidade em situação em tudo assemelhada à presente, pois, também se tratava de exposição a radiações ionizantes.
No que se refere aos agentes cancerígenos, cabe ressaltar que art. 68, § 4º, do Decreto 3.048/99, em vista dos dados relatados no parecer técnico da FUNDACENTRO de 13 de julho de 2010, foi alterado pelo Decreto 8.123/2013 e passou a apresentar a seguinte redação: “A presença no ambiente de trabalho, com possibilidade de exposição a ser apurada na forma dos §§ 2o e 3o, de agentes nocivos reconhecidamente cancerígenos em humanos, listados pelo Ministério do Trabalho e Emprego, será suficiente para a comprovação de efetiva exposição do trabalhador”.
Na nota nº 2 do anexo à Portaria Interministerial MPS/MTE/MS Nº 09 de 07.10.2014, consta que para efeito do art.68º 4º do Decreto 3.048/99 serão considerados agentes reconhecidamente cancerígenos aqueles do Grupo I do referido anexo (“agentes confirmados como carcinogênicos para humanos”) e dotados de registro no Chemical Abstracts Service (CAS).
Assim, quando há exposição a substãncia prevista no Grupo I da LINACH e CAS, não há mais dúvidas de que devem ser mensurados qualitativamente, não sendo considerados, na avaliação, os equipamentos de proteção coletiva e ou individual, uma vez que os estes não se mostram suficientes para elidir a insalubridade da exposição aos agentes em questão, independentemente do que afirma o laudo apresentado.
A discussão envolve apenas os agentes reconhecidamente cancerígenos presentes no Grupo I do referido anexo (“agentes confirmados como carcinogênicos para humanos”) e não dotados de registro no Chemical Abstracts Service (CAS).
A LINACH é a Lista Nacional de Agentes Cancerígenos para Humanos – criada pelos Ministérios do Trabalho e Emprego (MTE), Previdência Social (MPS) e da Saúde (MS), por meio da Portaria Interministerial Nº 9, de 7 de outubro de 2014. Desde então, a lista passou a ser utilizada como referência técnica para a realização de políticas prevencionistas. É composta por três grupos de agentes considerados cancerígenos. Eles são subdivididos em: Grupo 1, que é composto por 114 agentes comprovadamente cancerígenos para seres humanos, Grupo 2A, composto por 65 agentes provavelmente carcinogênicos para humanos e o Grupo 2B, que abrange 284 agentes possivelmente carcinogênicos para humanos.
Chemical Abstracts Service (CAS) é uma divisão da Sociedade Americana de Química (American Chemical Society), sediada em Columbus, Ohio, que produz os Chemical Abstracts, um indexo da literatura científica sobre a química e os ramos coligados. Os Chemical Abstracts são publicados desde 1907. A CAS mantém também o registro CAS, uma base de dados de substâncias químicas. Cada substancia desta base de dados recebe um número CAS único e estes números são muitas vezes utilizados para descrever de maneira única as substancias químicas. Alem disso as substâncias recebem um nome de índice CA único que é construído segundo as regras rígidas de nomenclatura. Para facilitar a procura de compostos próximos, o grupo funcional o mais importante da substancia é nomeado em primeiro lugar, seguido das modificações. As diversas bases de dados criadas pelo CA são propriedades deles e vendidas às empresas ou as bibliotecas universitárias.
Ainda que seja de relevante impostância a indexação da substância no Chemical Abstracts Service, não vejo motivo para que uma substância reconhecidamente cancerígena e que não tenha sido registrada na referida divisão tenha tratamento diferenciado daquelas que possuem referido registro, quanto ao reconhecimento da atividade especial, independentemente do uso de EPI.
De fato, a meu ver, não há que se fazer tal exigência, de registro no CAS, sendo que a presença no ambiente de trabalho, com possibilidade de exposição a ser apurada na forma dos §§ 2o e 3o, de agentes nocivos reconhecidamente cancerígenos em humanos, listados pelo Ministério do Trabalho e Emprego, será suficiente para a comprovação de efetiva exposição do trabalhador (Decreto 3.048/99, art. 68, § 4º, com redação dada pelo Decreto 8.123/13).
Ademais, só teria cabimento exigir indexação no CAS em se tratando de agente químico, sendo que no caso concreto estamos discutindo a exposição a agente físico: radiação ionizante.
Ao decidir pela exigência de análise quantitativa para elidir a especialidade do labor no interregno em discussão, mesmo em se tratando de agente reconhecidamente cancerígeno, listado no grupo 1 da LINACH, a Turma de origem o fez em contrariedade com o que vem decidindo esta Turma Nacional, a saber:
PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO NACIONAL. PREVIDENCIÁRIO. TEMPO ESPECIAL. AGENTE NOCIVO. AGENTES QUÍMICOS RECONHECIDAMENTE CANCERÍGENOS EM HUMANOS. ANÁLISE MERAMENTE QUALITATIVA. USO DE EPI EFICAZ: IRRELEVANTE. JURISPRUDÊNCIA DESTA TNU. INCIDENTE CONHECIDO E PROVIDO.A Turma Nacional de Uniformização, por unanimidade, decidiu conhecer e dar provimento ao incidente de uniformização para: (i) reafirmar a tese de que para o reconhecimento da insalubridade no caso de exposição à agentes nocivos reconhecidamente cancerígenos, constantes do Grupo 1 da lista da LINACH, basta a comprovação da sua presença no ambiente de trabalho (análise qualitativa) e a utilização de Equipamentos de Proteção Coletiva - EPC e/ou Equipamentos de Proteção Individual não elide a exposição desses agentes, ainda que considerados eficazes; e (ii) anular o acórdão da Turma Recursal de origem, para que esta promova a adequação do julgado de acordo com a premissa jurídica acima fixada.(Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei (Turma) 0001218-27.2012.4.03.6304, SERGIO DE ABREU BRITO - TURMA NACIONAL DE UNIFORMIZAÇÃO.
Nota-se que este colegiado não faz distinção entre os agentes químicos do Grupo 1 da LINACH que possuam registro no Chemical Abstract Service e aqueles que não possuem. Essa distinção deriva do Memorando-Circular Conjunto n° 2/DIRSAT/DIRBEN/INSS/2015.
Veja-se, ainda, que no Pedilef 5006019-50.2013.4.04.7204/SC, julgado sob o rito dos Representativos de controvérsia, foi decidido o seguinte:
INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO NACIONAL. REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TEMA 170. PREVIDENCIÁRIO. TEMPO ESPECIAL. AGENTES RECONHECIDAMENTE CANCERÍGENOS PARA HUMANOS. DECRETO 8.123/2013. LINACH. APLICAÇÃO NO TEMPO DOS CRITÉRIOS PARA ANÁLISE DA ESPECIALIDADE. DESPROVIMENTO. Fixada a tese, em representativo de controvérsia, de que "A redação do art. 68, § 4º, do Decreto 3.048/99 dada pelo Decreto 8.123/2013 pode ser aplicada na avaliação de tempo especial de períodos a ele anteriores, incluindo-se, para qualquer período: (1) desnecessidade de avaliação quantitativa; e (2) ausência de descaracterização pela existência de EPI".(TNU - Sessão de 17/08/2018, Relatora Juíza Federal Luisa Hickel Gamba).
Por seu turno, o § 4o do Decreto 3.048 diz que "A presença no ambiente de trabalho, com possibilidade de exposição a ser apurada na forma dos §§ 2º e 3º, de agentes nocivos reconhecidamente cancerígenos em humanos, listados pelo Ministério do Trabalho e Emprego, será suficiente para a comprovação de efetiva exposição do trabalhador.
Ante o exposto voto por conhecer e dar provimento ao Pedido de Uniformização para determinar o retorno dos autos à origem para adequação à tese jurídica ora firmada, de que: para o reconhecimento da insalubridade no caso de exposição a agentes nocivos reconhecidamente cancerígenos, constantes do Grupo 1 da lista da LINACH, independentemente de constar no CAS, basta a comprovação da sua presença no ambiente de trabalho (análise qualitativa), sendo certo que a utilização de Equipamentos de Proteção Coletiva - EPC e/ou Equipamentos de Proteção Individual não elide a exposição desses agentes, ainda que considerados eficazes.