AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 965.487 - SP (2016/0210442-4)
DECISÃO
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. ACERVO PROBATÓRIO PRODUZIDO NOS AUTOS NÃO ANALISADO. NECESSIDADE DE SE RECONHECER A NULIDADE DO ACÓRDÃO. PRIMAZIA DA PROTEÇÃO AOS DIREITOS FUNDAMENTAIS. TESE DO PODER SEM VERDADE (O JUÍZO SEM PROVA), CONTRAPOSTA À VERDADE SEM PODER (AS PROVAS DESCARTADAS). AGRAVOS CONHECIDOS PARA DAR PROVIMENTO AOS RECURSOS ESPECIAIS DO SEGURADO E DO MPF.
1. Agrava-se de decisão que negou seguimento a Recurso Especial interposto com base nas alíneas a e c do art. 105, III da Constituição Federal, objetivando a reforma do acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da 3a. Região, assim ementado:
AGRAVO. ART. 557 DO CPC. PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO.
AUXÍLIO-DOENÇA OU APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AGRAVO IMPROVIDO.
I - No agravo previsto no art. 557 do CPC, a controvérsia limita-se ao exame da ocorrência, ou não, de flagrante ilegalidade ou abuso de poder, a gerar dano irreparável ou de difícil reparação para a parte, vícios inexistentes na decisão agravada.
II - Razões recursais que não contrapõem tal fundamento a ponto de demonstrar o desacerto da decisão, limitando-se a reproduzir argumento visando a rediscussão da matéria nele decidida.
III - Agravo improvido.
2. Em seu Apelo Nobre, sustenta o Segurado que o Tribunal incorreu em cerceamento de defesa, vez que se faria necessária a perícia médica com especialista em distúrbios psiquiátricos.
3. O MPF, por sua vez, aponta a incongruência do acórdão recorrido que desconsiderou os fatos supervenientes ao ajuizamento da ação, que dão conta da sentença de interdição da parte autora e a concessão do benefício assistencial para pessoa com deficiência pela própria Autarquia administrativamente.
4. É o relatório.
5. Cuida-se de ação postulando a concessão de benefício previdenciário por incapacidade, ante o quadro clínico do Segurado que impede o seu retorno ao mercado de trabalho, ajuizada em 2012.
6. Realizada a perícia judicial, entendeu o perito que o autor não apresentava quadro de incapacidade, razão pela qual o Juízo julgou improcedente a ação.
7. Em sede de Apelação, o Tribunal de origem, confirmando a sentença, negou a ocorrência de cerceamento de defesa, mantendo a improcedência do pedido, amparado, tão somente, no laudo judicial, sem fazer qualquer consideração quanto à alegação de que fora decretada a interdição civil do autor e a concessão administrativa de benefício à pessoa com deficiência pelo INSS.
8. É certo que a atividade judicial é regida pelo princípio do livre convencimento, não havendo que se falar em tarifação de provas. Assim, não há que se dizer que uma prova teria melhor valia que outra na avaliação de uma demanda.
9. Nesse sentido, é entendimento pacífico desta Corte o de que o ordenamento jurídico pátrio adotou o princípio do livre convencimento motivado do julgador, no qual o juiz pode fazer uso de outros meios para formar sua convicção, sendo certo que o magistrado não se encontra adstrito ao laudo pericial quando da apreciação e valoração das alegações e das provas existentes nos autos, podendo, inclusive, decidir contrariamente a ele quando houver nos autos outros elementos que assim o convençam, como ocorre na presente demanda. Confira-se:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE PARCIAL.
CONSIDERAÇÃO DOS ASPECTOS SÓCIO-ECONÔMICOS, PROFISSIONAIS E CULTURAIS. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES.
1. O Tribunal de origem deixou claro que, na hipótese dos autos, o autor não possui condições de competir no mercado de trabalho, tampouco desempenhar a profissão de operadora de microônibus.
2. necessário consignar que o juiz não fica adstrito aos fundamentos e à conclusão do perito oficial, podendo decidir a controvérsia de acordo o princípio da livre apreciação da prova e do livre convencimento motivado.
3. A concessão da aposentadoria por invalidez deve considerar, além dos elementos previstos no art. 42 da Lei n. 8.213/91, os aspectos socioeconômicos, profissionais e culturais do segurado, ainda que o laudo pericial apenas tenha concluído pela sua incapacidade parcial para o trabalho. Precedentes das Turmas da Primeira e Terceira Seção. Incidência da Súmula 83/STJ Agravo regimental improvido (AgRg no AREsp. 384.337/SP, Rel. Min. HUMBERTO MARTINS, DJe 9.10.2013).
DIREITO PREVIDENCIÁRIO - AUXÍLIO ACIDENTE - INCAPACIDADE PARCIAL E PERMANENTE - LAUDO PERICIAL - LIVRE CONVENCIMENTO DO JUIZ.
1. O magistrado não está adstrito às conclusões da perícia técnica para a formação do seu convencimento acerca da existência ou não da moléstia incapacitante, podendo, por outros meios de prova, fundamentar o seu entendimento. Princípio do livre convencimento.
Precedentes.
2. Hipótese em que o Tribunal de origem consignou a conclusão pela existência de incapacidade parcial e permanente do autor.
3. Agravo regimental não provido (AgRg no AREsp. 301.837/SP, Rel. Min. ELIANA CALMON, DJe 24.9.2013).
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. LAUDO PERICIAL. NÃO VINCULAÇÃO.
LIVRE CONVENCIMENTO FUNDADO EM OUTROS MEIOS DE PROVA. POSSIBILIDADE.
AUXÍLIO-ACIDENTE. LESÃO MÍNIMA. DIREITO AO BENEFÍCIO.
1. O juiz não está adstrito às conclusões da perícia técnica, podendo se pautar em outros elementos de prova aptos à formação de seu livre convencimento, estando autorizado a concluir pela incapacidade laborativa fundado no conjunto probatório produzido nos autos e nas particularidades do caso concreto. Precedentes.
2. O tema trazido nas razões de recurso especial já foi enfrentado pela Terceira Seção desta Corte, no julgamento do REsp 1.109.591/SC, pelo rito estabelecido pelo art. 543-C do CPC, sendo consolidado o entendimento de que, para a concessão de auxílio-acidente, é necessário que a sequela acarrete a diminuição da capacidade laborativa do segurado, ainda que em grau mínimo.
3. Ficou incontroverso que a lesão decorrente do acidente de trabalho sofrido pelo autor deixou sequelas que provocaram o decréscimo em sua capacidade laborativa. Assim, é de rigor a concessão do benefício de auxílio-acidente, independentemente do nível do dano e, via de consequência, do grau do maior esforço.
4. Agravo regimental a que se nega provimento (AgRg no AREsp.
309.593/SP, Primeira Turma, Rel. Min. SÉRGIO KUKINA, DJe 26.6.2013).
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. PRINCÍPIOS DO LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO. ARTIGO 20 DA LEI Nº 8.742/93. DEFICIÊNCIA. COMPROVAÇÃO. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. INVIABILIDADE. SÚMULA Nº 7/STJ. AGRAVO DESPROVIDO.
I. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é uníssona no sentido de que o julgador não se vincula às conclusões do laudo pericial, razão pela qual, em atendimento ao princípio do livre convencimento motivado, previsto no artigo 131 do Código de Processo Civil, é facultado a este formar sua convicção com fundamento em outros elementos colhidos nos autos.
II. Rever o posicionamento do Tribunal de origem, no ponto em que entendeu que a parte autora teria direito ao benefício assistencial, demandaria o reexame fático-probatório, o que é inadmissível nesta instância especial. Incidência do enunciado n. 07 da Súmula desta Corte.
III. Agravo interno desprovido (AgRg no AREsp. 63.463/CE, Rel. Min. GILSON DIPP, DJe 20.6.2012).
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. BENEFÍCIO ACIDENTÁRIO. REQUISITOS AFASTADOS PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS COM BASE NAS PROVAS DA CAUSA. PLEITO DE RENOVAÇÃO DA PROVA PERICIAL. DILAÇÃO PROBATÓRIA CONSIDERADA DESNECESSÁRIA PELA CORTE DE ORIGEM, TENDO EM VISTA A SUFICIÊNCIA DO LAUDO PRODUZIDO. FACULDADE DO JULGADOR. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO CONFIGURAÇÃO. REVERSÃO DO JULGADO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N.º 07/STJ. AGRAVO DESPROVIDO.
1. Estabelece o art. 436 do Código de Processo Civil que "O juiz não está adstrito ao laudo pericial, podendo formar a sua convicção com outros elementos ou fatos provados nos autos". E, em seu art. 437, a lei processual não exige, mas, simplesmente, atribui ao juiz o poder de determinar a realização de nova perícia quando a matéria não lhe parecer suficientemente esclarecida.
2. Na hipótese em apreço, as instâncias ordinárias, após minuciosa análise das provas da causa, e com base no livre convencimento motivado, concluíram que o material probatório acostado aos autos é suficiente para o deslinde da controvérsia, e que não estão preenchidos os pressupostos legais necessários à concessão do auxílio-acidente. Sendo assim, não há como afastar a incidência da Súmula n.º 07/STJ sobre a espécie, tal como decidido pela decisão ora atacada.
3. Agravo regimental desprovido (AgRg no Ag 1.281.365/ES, Rel. Min. LAURITA VAZ, DJe 24.5.2010).
10. Ao mesmo tempo, é de registrar que o objeto da demanda tem relevante valor social, cuidando-se de ação para concessão de benefício por incapacidade, objetivando assegurar ao trabalhador renda para sua manutenção e sobrevivência, o que exige especial atenção do julgador.
11. As instâncias de origem se prenderam à análise de uma única prova - a perícia judicial assinada por clínico geral -, desconsiderando todo o restante, e robusto, acervo probatório que indicava situação diversa daquela atestada no laudo judicial. Há, como já consignado, laudos particulares, laudo judicial e laudo administrativo, todos eles dando conta da incapacidade do autor.
12. Ora, deve se ter claro que ao Magistrado é particularmente grave e urgente a função de garantir os direitos fundamentais, por situar-se o Julgador muito além da mera gestão burocrática administrativa, uma vez que efetua importante tarefa de prestação jurisdicional, devendo, nessa atividade, promover essencialmente a Justiça, sobretudo quando estão em jogo direitos fundamentais que garantem a subsistência digna do indivíduo, direitos que se relacionam diretamente com a garantia da dignidade da pessoa humana.
13. A maturação da causa, neste caso, é dependente da oportunização da produção de provas e da exauriente análise de todo o acervo produzido, não podendo se restringir à análise do laudo pericial.
Sem isso, instala-se no processo previdenciário a perigosa tese do poder sem verdade (o juízo sem prova), contraposta à verdade sem poder (as provas descartadas), colocando o Segurado em posição especialmente frágil e vulnerável, que impõe o acolhimento da pretensão.
14. Nesse especial cenário, é de se reconhecer a nulidade do acórdão, impondo-se determinar o retorno dos autos ao Tribunal de origem para que se reexamine todo o conjunto probatório produzido nos autos, não somente o laudo pericial judicial, admitindo-se, caso o Tribunal não se convença da comprovação da incapacidade, a oportunização de nova perícia judicial com médico psiquiatra.
15. Ante o exposto, conhece-se dos Agravos para dar provimento ao Recursos Especiais do Segurado e do Ministério Público Federal, nos termos da orientação aqui fixada.
16. Publique-se. Intimações necessárias.
Brasília (DF), 03 de fevereiro de 2020.
NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO MINISTRO RELATOR
(AREsp n. 965.487, Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, DJe de 05/02/2020.)